Mineirinho - Clarice Lispector

O décimo terceiro tiro me assassina - porquê eu sou o outro. Porque eu quero ser o outro. 

É, suponho que é em mim, como um dos representantes de nós, que devo procurar por que esta doendo a morte de um facínora. E por que é que mais me adianta contar os treze tiros que mataram Mineirinho do que os seus crimes. Perguntei a minha cozinheira o que pensava sobre o assunto. Vi no seu rosto a pequena convulsão de um conflito, o mal-estar de não entender o que se sente, o de precisar trair sensações contraditórias por não saber como harmonizá-las. 

Fatos irredutíveis, mas revolta irredutível também, a violenta compaixão da revolta. Sentir-se dividido na própria perplexidade diante de não poder esquecer que Mineirinho era perigoso e já matara demais; e no entanto nós o queríamos vivo. A cozinheira se fechou um pouco, vendo-me talvez como a justiça que se vinga. Com alguma raiva de mim, que estava mexendo na sua alma, respondeu fria: 'O que eu sinto não serve para se dizer. Quem não sabe que Mineirinho era criminoso? Mas tenho certeza de que ele se salvou e já entrou no Céu.' Respondi-lhe que 'mais do que muita gente que não matou'. Por que? 

No entanto a primeira lei, a que protege corpo e vida insubstituíveis, é a de que não matarás. Ela é a minha maior garantia: assim não me matam, porque eu não quero morrer, e assim não me deixam matar, porque ter matado será a escuridão para mim. Esta é a lei. Mas há alguma coisa que, se me fez ouvir o primeiro tiro com um alívio de segurança, no terceiro me deixa alerta, no quarto desassossegada, o quinto e o sexto me cobrem de vergonha, o sétimo e o oitavo eu ouço com o coração batendo de horror, no nono e no décimo minha boca está trêmula, no décimo primeiro digo em espanto o nome de Deus, no décimo segundo chamo meu irmão. O décimo terceiro tiro me assassina - porquê eu sou o outro. Porque eu quero ser o outro. 

Essa justiça que vela meu sono, eu a repudio, humilhada por precisar dela. Enquanto isso durmo e falsamente me salvo. Nós, os sonsos essenciais. Para que minha casa funcione, exijo de mim como primeiro dever que eu seja sonsa, que eu não exerça a minha revolta e o meu amor, guardados. Se eu não for sonsa, minha casa estremece. Eu devo ter esquecido que embaixo da casa está o terreno, o chão onde nova casa poderia ser erguida. Enquanto isso dormimos e falsamente nos salvamos. Até que treze tiros nos acordem, e com horror digo tarde demais - vinte e oito anos depois que Mineirinho nasceu - que ao homem acuado, que a esse não nos matem. Porque sei que ele é o meu erro. E de uma vida inteira, por Deus, o que se salva às vezes é apenas o erro, e eu sei que não nos salvaremos enquanto nosso erro não nos for preciso. 

Meu erro é o meu espelho, onde vejo o que em silêncio eu fiz de um homem. Meu erro é o modo como vi a vida se abrir na sua carne e me espantei, e vi a matéria de vida, placenta e sangue, a lama viva. Em Mineirinho se rebentou o meu modo de viver. Como não amá-lo, se ele viveu até o décimo terceiro tiro o que eu dormia? Sua assustada violência. Sua violência inocente - não nas conseqüências, mas em si inocente como a de um filho de quem o pai não tomou conta. Tudo o que nele foi violência é em nós furtivo, e um evita o olhar do outro para não corrermos o risco de nos entendermos. 

Para que a casa não estremeça. A violência rebentada em Mineirinho que só outra mão de homem, a mão da esperança, pousando sobre sua cabeça aturdida e doente, poderia aplacar e fazer com que seus olhos surpreendidos se erguessem e enfim se 3º ano Mineirinho Mineirinho Wilton fev/08 Nome: Nº: Turma: Português enchessem de lágrimas. Só depois que um homem é encontrado inerte no chão, sem o gorro e sem os sapatos, vejo que esqueci de lhe ter dito: também eu. Eu não quero esta casa. 

Quero uma justiça que tivesse dado chance a uma coisa pura e cheia de desamparo e Mineirinho - essa coisa que move montanhas e é a mesma que o faz gostar 'feito doido' de uma mulher, e a mesma que o levou a passar por porta tão estreita que dilacera a nudez; é uma coisa que em nós é tão intensa e límpida como uma grama perigosa de radium, essa coisa é um grão de vida que se for pisado se transforma em algo ameaçador - em amor pisado; essa coisa, que em Mineirinho se tornou punhal, é a mesma que em mim faz com que eu dê água a outro homem, não porque eu tenha água, mas porque, também eu, sei o que é sede; e também eu, não me perdi, experimentei a perdição. A justiça prévia, essa não me envergonharia. 

Já era tempo de, com ironia ou não, sermos mais divinos; se adivinhamos o que seria a bondade de Deus é porquê adivinhamos em nós a bondade, aquela que vê o homem antes de ele ser um doente do crime . Continuo, porém, esperando que Deus seja o pai, quando sei que um homem pode ser o pai de outro homem. E continuo a morar na casa fraca. Essa casa, cuja porta protetora eu tranco tão bem, essa casa não resistirá à primeira ventania que fará voar pelos ares uma porta trancada. Mas ela está de pé, e Mineirinho viveu por mim a raiva, enquanto eu tive calma. 

Foi fuzilado na sua força desorientada, enquanto um deus fabricado no último instante abençoa às pressas a minha maldade organizada e a minha justiça estupidificada: o que sustenta as paredes de minha casa é a certeza de que sempre me justificarei, meus amigos não me justificarão, mas meus inimigos que são os meus cúmplices, esses me cumprimentarão; o que me sustenta é saber que sempre fabricarei um deus à imagem do que eu precisar para dormir tranqüila, e que os outros furtivamente fingirão que estamos todos certos e que nada há a fazer. Tudo isso, sim, pois somos os sonsos essenciais, baluartes de alguma coisa. 

E sobretudo procurar não entender. Porque quem entende desorganiza. Há alguma coisa em nós que desorganizaria tudo - uma coisa que entende. Essa coisa que fica muda diante do homem sem o gorro e sem os sapatos, e para tê-los ele roubou e matou; e fica muda diante do S. Jorge de ouro e diamantes. Essa alguma coisa muita séria em mim fica ainda mais séria diante do homem metralhado. Essa alguma coisa é o assassino em mim? Não, é o desespero em nós. Feito doidos, nós o conhecemos, a esse homem morto onde a grama de radium se incendiara. 

Mas só feito doidos, e não como sonsos, o conhecemos. É como doido que entro pela vida que tantas vezes não tem porta, e como doido compreendo o que é perigoso compreender, e como doido é que sinto o amor profundo, aquele que se confirma quando vejo que o radium se irradiará de qualquer modo, se não for pela confiança, pela esperança e pelo amor, então miseravelmente pela doente coragem de destruição. Se eu não fosse doido, eu seria oitocentos policiais com oitocentas metralhadoras, e esta seria a minha honorabilidade. Até que viesse uma justiça um pouco mais doida. Uma que levasse em conta que todos temos que falar por um homem que se desesperou porque neste a fala humana já falhou, ele já é tão mudo que só o bruto grito desarticulado serve de sinalização. 

Uma justiça prévia que se lembrasse de que nossa grande luta é a do medo, e que um homem que mata muito é porque teve muito medo. Sobretudo uma justiça que se olhasse a si própria, e que visse que nós todos, lama viva, somos escuros, e por isso nem mesmo a maldade de um homem pode ser entregue à maldade de outro homem: para que este não possa cometer livre e aprovadamente um crime de fuzilamento. 

Uma justiça que não se esqueça de que nós todos somos perigosos, e que na hora em que o justiceiro mata, ele não está mais nos protegendo nem querendo eliminar um criminoso, ele está cometendo o seu crime particular, um longamente guardado. Na hora de matar um criminoso - nesse instante estásendo morto um inocente. Não, não é que eu queira o sublime, nem as coisas que foram se tornando as palavras que me fazem dormir tranqüila, mistura de perdão, de caridade vaga, nós que nos refugiamos no abstrato. O que eu quero é muito mais áspero e mais difícil: quero o terreno". 

(“Mineirinho”, de Clarice Lispector, Para não esquecer, Editora Siciliano)

Você acredita ou confia no sistema?

Nunca o tal “Sistema” foi tão importante como agora. Ele é superior a gerentes, chefes ou qualquer outro tipo de cargo em empresas multinacionais, ou mesmo em postos dos governos municipais, estaduais ou federal. O sistema é capaz de mudar a vida das pessoas e pode nos deixar na mão. Sim! Não há ninguém superior que ao tal “Sistema”. Antes achava que a definição de sistema era simples, como o Wikipédia o define: “Um sistema (do grego sietemiun), é um conjunto de elementos interconectados, de modo a formar um todo organizado”.
Organização. Esta é a palavra chave. Lidamos com ele em nosso dia a dia. Estes dias fiquei superdependente do tal “Sistema” e nem eu e nem ninguém conseguiu encontrá-lo e muito menos o fez mudar de ideia. Tudo começou quando liguei para a empresa de televisão por assinatura, falei com um fantasma e a voz metálica me obrigava a digitar um monte de números. Ela dizia: “se você quer comprar uma assinatura, digite 1, problemas de conexão, 2”... Quando chegou na opção 9 depois de um tempão, a voz mandou esperar para falar com um atendente. Esperei, esperei e nada. Depois de alguns minutos, ela aparece novamente porque a linha estava ocupada, e novamente repete as opções antigas já ditas, até a opção 9, e me pede para aguardar.
Daí então uma pessoa (verdadeira) me atende. Pedi para cancelar o serviço, e o atendente m diz: “Hoje não é possível, pois caiu o Sistema”. Como assim? Se caiu levanta! Aí o cara me pediu para ligar mais tarde até o Sistema voltar. Então esse tal Sistema cai e sai por aí e ficamos na mão!?. Mas isso não era nada do que estaria por vir mais tarde. Tive que ir ao banco 24 horas, fiquei cerca de 20 minutos na fila e quando chega a minha vez, aparece uma mensagem na tela: “Caixa sem Sistema”. Tá de brincadeira! Pensei. Tive que ir até uma agência bancária e, novamente peguei uma baita fila, porém deu tudo certo.
Ufa! O caixa nem mencionou o nome do Sistema. Então aproveitei o tempo e fui falar com a gerente da Pessoa Física, é o que dizia a plaquinha na mesa dela, e fui até lá para desbloquear o cartão de crédito. Sentei entreguei o cartão, ela digitou... Olhou feio para a tela do computador, digitou... Olhava feio, e digitava e olhava feio... E enfim me disse: Infelizmente não vou conseguir. Por quê? Indaguei. “Deu problema no Sistema”, ela me respondeu.
Fui embora e mais tarde entrei em uma loja para mudar o plano do celular. A atendente pegou meus dados e me apresentou as propostas. Ao pedir um desconto para um determinado plano, ela falou. “Não posso, o Sistema não deixa”. Como assim? Chama a gerente. Ela veio. “Gostaria de um desconto?”, perguntou a gerente. E então, ela me retrucou. “Infelizmente o nosso Sistema não permite, não podemos fazer nada”.

Notei que a sociedade aos poucos está sendo desconfigurada para a configuração do novo Sistema. À noite liguei a televisão e uma multidão de pessoas protestava nas ruas. Uns querendo um novo sistema, outros brigam pela a manutenção dele, enfim, o Sistema é poderoso, afinal ele dita as regras, e manda mais que os caixas eletrônicos, atendentes, chefes, gerentes, bancos... Alguns dizem que só há uma maneira para detê-lo, que é programando-o, configurando-o e gerenciando-o. Porém, basta cair à energia para o sistema cair. Cabe agora saber, quem é que vai cortar o fio.

Em sua terceira passagem pelo Brasil, Moz faz um show introspectivo

Não, realmente não foi um show qualquer, pode ter sido o último show do ex-Smiths no Brasil, na apresentação do último sábado, dia 21, no Citi Hall, em São Paulo. Esta foi a terceira tour pelo Brasil, a primeira foi em 2000, e 12 anos depois, veio pela segunda vez em 2012, e sua terceira tour seria em 2014, mas foi adiada por motivos de saúde e, agora, faz a sua terceira tour para promover o seu último álbum “World Peace Is None of Your Business”, de 2014.
Desde o fim dos Smiths, nos anos 80, todos os shows de Morrissey, comparecem fãs da banda inglesa vestindo literalmente a camisa, lotam seus shows, entretanto, Moz nega-se a cantá-las. Lembro-me de sua primeira passagem em um show no Olímpia, quando um fã gritou para que ele tocasse Smiths, ele foi bem enfático e direto. “Smiths is dead”. E tocou apenas “meat is murder”, pregando o vegetarianismo, o seu modo “Morrisey de ser”.
Na segunda passagem, em 2012, ele tocou algumas faixas a mais dos Smiths, como “Still ill”, “How son is now” e “There is a Light that Never Goes Out”, porém em São Paulo o show foi prejudicado, já que uma das caixas de som do Espaço das Américas deu problema.
E, finalmente nesta terceira tour, o show foi o mais diferente, mais intimista. Triste para alguns e um show precioso para outros. Muitos comentavam: “Não gostei de nenhuma música, apenas a primeira (Suedehead)”, disse uma pessoa ao meu lado. Mas é preciso levantar alguns pontos específicos para chegar a esta conclusão. Antes de todos os shows, Morrissey faz uma seleção de vídeos de seus cantores e grupos favoritos, e, estas músicas não eram nada pop, eram canções e artistas estranhos para o público brasileiro. Mas, sem a maioria saber, aquilo fazia parte do show. Em um telão em frente ao palco, foram apresentadas bandas como: The Sparks, New York Dolls e uma interpretação fantástica de Charles Aznavour – “La Boéme”, e depois uma mulher grita e abrem-se as cortinas, quando neste momento, o telão sobe e a banda se apresenta.
Era claro a expectativa de um show de grandes hits, mas não foi. Seus últimos álbuns, “You are the Quarry”, de 2004, “Ringleader of The Tormentors”, de 2006, “Years of Refusal”, de 2009 e, finalmente seu último trabalho” World Peace Is None of Your Business”, de 2014, são álbuns profundamente intimistas. Percebe-se uma produção perfeita nestes discos, com letras tristes, em um mundo cada vez mais depressivo de uma sociedade doente, não há hits, apenas belas canções. 
E foi deste jeito o show. Sem grandes hits, apenas belas músicas tocadas por uma banda competente, com grandes momentos como em “Smiler with Knife”, quando começou a cantar acapela e teve que parar quando alguém começou a gritar, e ele, de imediato parou de cantar e falou: “Quer o microfone?” “Perdeu a cabeça?”, e em seguida recomeçou a música. No final, parte do público saiu decepcionado, pois não houve hits, porém um grande show.

MC Tavinho, homenagem a Pitangui - Minas Gerais

Conhecer a cidade onde o meu pai nasceu antes de vir para São Paulo e onde mora parte da minha família é um enorme prazer, principalmente quando se conhece e tem acesso a história da cidade. Conheci Tavinho, ou MC Tavinho que homenageou o aniversário de 300 anos de Pitangui.

Pitangui é a sétima Vila do Ouro das Minas Gerais. É uma cidade que respira história. Sua riqueza, em termos culturais, vai além do município, atingindo todo o Estado e o Brasil.  A cidade foi descoberta por bandeirantes paulistas, chefiados por Bartolomeu Bueno da Siqueira, foi foi considerada a Sétima Vila do Ouro criada no Estado, em 1715, no ciclo do ouro, e elevada à cidade em 1855. 
Pertence hoje à Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais e ainda, ao Circuito Verde – Trilha dos Bandeirantes. Terra-mãe do Centro-Oeste Mineiro, por ser a cidade mais antiga da região, é berço de mais de 40 municípios de Minas Gerais. 
Pitangui é um convite ao turismo histórico, artístico-cultural e ecológico. Para se ter idéia do potencial histórico de Pitangui, é bom lembrar que a luta pela Independência do Brasil nasceu e culminou com a presença ativa de personagens de sua história. 
Entre 1713 e 1720, aconteceram as primeiras revoltas pitanguienses contra as imposições da Coroa Portuguesa, sendo a primeira, a Sublevação da Cachaça. A Revolta de 1720, liderada por Domingos Rodrigues do Prado, contra a cobrança do quinto do ouro, conclamava que “quem pagasse, morria”
Apesar da derrota da Vila de Pitangui, os pitanguienses não pagaram e Conde de Assumar, então governador da Capitania, teve, contrariamente à sua vontade, de anistiar a dívida, dizendo que “essa Vila deveria ser queimada para que dela não se tivesse mais memória”, chamando a população local de “mulatos atrevidos”. Foi a 1ª grande revolta contra a Coroa, antes mesmo da de Felipe dos Santos, em Ouro Preto.

Veja mais a história de Pitangui no site da cidade - Link

Blog de Notícias e História da Cidade - Daqui de Pitangui

O programa Esquenta é odiado pela “burguesia”, da direita e da esquerda


Se há um programa que causa debates na televisão aberta é o “Esquenta”, veiculado aos domingos na Rede Globo para todo o país. Uma breve pesquisa na internet revelará várias críticas ao dominical comandado por Regina Casé que atinge altos índices de audiência por ser ou tentar ser o porta voz da periferia, e isto causa polêmicas em todos os aspectos.

Nas últimas décadas criou-se um senso comum que a linguagem da periferia é o rap, principalmente em São Paulo, por isto há vários programas que exaltam a cultura hip hop como o único gênero da periferia, como Manos e Minas, entre outros. Ficam de fora, às vezes o samba, o funk, sertanejo, entre outros.

Fiquei interessado sobre o tema ao assistir alguns programas e, acho a proposta bem legal. Como mostrar a periferia de uma forma alegre? Ela (Regina Casé) faz um programa digno e fui repreendido por um conhecido ao fazer tal afirmação. Intelectual de esquerda, marxista nato, afirmou-me que é um atestado de pobreza e burrice ver tal programa, pois valoriza apenas uma cultura duvidosa e alienante. Outro dia, um outro conhecido, este conservador, afirmou a mesma coisa, praticamente o mesmo argumento, aí cheguei a uma conclusão: “O programa Esquenta é criticado não por suas características, mas sim pelo preconceito”.

A periferia é multicultural, tem de tudo, e é esta mistura é a síntese do Esquenta, “tudo junto e misturado”. Mas isto não é bem visto por críticos intelectuais principalmente estes “burgueses” de todos os gêneros. É possível encontrar críticas ao Esquenta com teores preconceituosos, como este que encontrei na internet.

“Comandado pela brega Regina Casé (sic) ... O dominical tem a roupagem espalhafatosa e colorida das roupas da apresentadora... O programa mostra um Brasil com valores culturais pobres ao levar para exibição o que considera a voz dos marginalizados. Então é comum ver um linguajar cheio de gírias, moças seminuas rebolando, dançando funk e outros ritmos ao som de letras pobres e sem sentido, senão o de exaltar a sensualidade e o sexo fácil. O Esquenta mostra o Brasil dos desgraçados, dos desprovidos de sonhos, dos que não tem expectativas, dos que estão juntos e misturados. Uma grande periferia, onde o nóia está próximo do traficante. Onde a dona de casa e o trabalhador a tudo vê, tudo ouve, tudo sente, mas que finge que nada viu, nada escutou, nada sentiu e ainda tem o bandido e traficante como amigo do peito. Tudo junto e misturado, é esta a impressão que O Esquenta passa”. (Ver texto original).

Há ainda textos engajados que afirmam que o programa tem características racistas, por colocar o negro em posições “suburbanas”. “O programa reforça o estereótipo dos negros brasileiros como indivíduos suburbanos, subempregados, mas ainda assim felizes, sempre com um sorriso no rosto, esquecendo-se das mazelas cotidianas por meio da dança, do remelexo, das rimas pobres do funk, do mau gosto de penteados e cortes de cabelo extravagantes” (ver a matéria original).

Caro amigo ou amiga que lê estas poucas linhas, o fato, é que a periferia incomoda, seja qual for a abordagem. Qualquer tipo de programação que mostre uma cultura que não venha do “mainstream” central, ou da Vila Madalena e adjacências elitizadas espalhadas pelo nosso Brasil, será sempre vista como uma subcultura, e sempre será criticada por todos, não importando a ideologia.

A cultura seja ela qual for, deve transitar entre si como trocas de informações, fazendo com a cidade possa ser mais homogênea, mesmo com tantas diversidades de gêneros. As informações nos botecos da periferia são diferentes dos “botecos” elitizados com suas músicas e comidas gourmet; são, na maioria das vezes, mais “frescas”, saindo do forno, sempre com uma moda diferente, com roupas coloridas e cortes de cabelo com gosto duvidoso para alguns. 

Mesmo assim, ganhará a mídia e irá se apresentar em programas como o Esquenta. Depois disso, será elitizado nos bairros ricos e nos bares gourmet e nos locais onde vendem comidas de rua, ops! Aliás, agora é truck foods. Enfim, vários usuários espalharão esta moda do subúrbio pela cidade e, ainda assim, continuarão a condenar tudo que a televisão mostra da periferia, seja do bem ou do mal. Onde fica mesmo a periferia?

A censura e a incensura da burguesia e a linguagem "figurada"


As letras de funk e dos raps da periferia são alvos constantes de preconceito pela mídia e da classe dominante em si. Não quero aqui defender um estilo em detrimento do outro, mesmo porque não gosto nenhum pouco de funk com suas letras "pesadas" e do rap (também tem letras pesadas) mas vejo mais talentos, como Emicida, Criolo, Racionais, entre outros, que levam o estilo e a cultura à frente, mas trata-se apenas de um gosto pessoal.

Muitos se esquecem que a música é uma linguagem. Às vezes, outros gêneros dão à voz ao "bandido" e ainda o transformam no protagonista, como o cinema, o teatro e a literatura, e tudo se transforma em ficção. Com a letra das músicas é a mesma coisa. Mas, isto vai depender diretamente de quem canta, pois o preconceito, vai desde as letras e também do emissor, deixando claro um preconceito bem latente, tanto da linguagem, como cultural. Se for um cantor oriundo da classe média, a letra que fala de violência, é interpretada como "figura de linguagem", e é vista a beleza lirica da canção. Peguei um texto clássico, um bom exemplo disto, é a letra da música "Exagerado" do Cazuza.

"...E por você eu largo tudo
Vou mendigar, roubar, matar
Até nas coisas mais banais
Pra mim é tudo ou nunca mais..."

Não quero tentar fazer uma análise linguística desta letra, mas este trecho em si, é visto como algo "belo" e romântico, mas os três verbos "mendigar",  "matar" e "roubar", não contem nada de "romântico", se este trecho fosse interpretado por qualquer  MC de funk ou por algum rapper, poderia sofres sérios problemas de preconceito. A subversão do substantivo "mendigo" em verbo, dá a impressão que ser mendigo é uma opção.

Será que se o Mano Brown dos Racionais cantasse esta letra em ritmo de rap teria o mesmo contexto de Cazuza? Mas, a música do Cazuza, é legal, afinal, ele é considerado um poeta que representou uma geração. Será? Particularmente, gosto de algumas canções, mas é um cantor comum, nada mais do que isto.

O problema é o "endeusamento" de alguns artistas em detrimento de outros, que falam a mesma coisa, e a única diferença é a classe social e o preconceito latente em nossa sociedade.

As Vantagens de Ser Invisível - Seria já um clássico?


Estes dias conversando com alguns amigos sobre o que foi a juventude dos anos 90, começamos a divagar sobre algo que pudesse representar, ao menos, um pouco, o que foi aquela geração, principalmente baseada nos filmes. Lembramos de alguns títulos como “Singles” (Vida de Solteiro) e alguns outros. A turma falou que sentia falta de filmes desta geração e, para minha surpresa, me deparei com o filme “As vantagens de ser solteiro”, história baseada no livro.

Comecei assisti ao filme sem intenções, e aos poucos, a cada quadro, me surpreendia com o personagem Charlie que é o personagem que narra o filme em primeira pessoa e percebe-se que é um jovem traumatizado, e as revelações acontecem aos poucos, por conta do suicídio de seu melhor amigo e também sobre a morte de sua tia, tudo isto somados aos problemas de sua escola com “bulling” que ele sofria. Este roteiro, parece clichê, mas a forma como os fatos são narrados revelam ao público as sensações deste protagonista.

Charlie era um cara tímido, mais com um potencial de “louco”, no sentido que vale a pena fazer tudo para curtir a vida ao máximo, e acaba fazendo amizades com um grupo que tinha as suas mesmas características.

Seus amigos Patrick e Sam a eterna ex-Harry Porter Emma Watson, são fundamentais para a reconstrução da identidade de Charlie, assim como o seu professor de literatura, interpretado por John Cusack. Um dos traumas deste herói, era o amor pela sua tia de uma forma doentia (não vou entrar em detalhes para não atrapalhar que ainda não assistiu ao filme).

Duas cenas inesquecíveis são essenciais para este belo filme e, a primeira com a belíssima interpretação de Emma Watson, quando Sam escuta pela primeira vez a música Heroes de David Bowie e no final esta cena é repetida por Charlie. Não que o filme seja um clássico, mas ele deixa marcas profundas sobre o que foi os anos 90 e sua geração, mas talvez sim. A vantagem de ser invisível já nasce “Clássico”.

Rock in Rio: um festival necessário para a cultura pop

Entrada principal do Rock in Rio, um ponto de selfies para quem chegava ao local
Para a sobrevivência da cultura musical pop, os festivais deverão sempre existir. Depois do Festival de Woodstock em 1968, em uma fazenda nos Estados Unidos, esta modalidade de shows fez parte de um entretenimento inevitável para a música. “A sociedade consome o que ela produz”, já dizem alguns sociólogos e, este consumo está relacionado também ao indivíduo e, quando se trata de música, os grandes festivais são um reflexo social e cultural das apresentações, assim como os músicos envolvidos e, as razões pela qual os festivais acontecem. No caso específico do Rock in Rio, é simplesmente, lazer nonsense, apenas festejar a cultura pop.
Naturalmente tive que entrar no clima "selfie"
A critica do jornalista Alexandre Matias, do UOL, publicada nesta segunda, dia 28, sobre o “shopping pago com trilha sonora”, é descontextualizada, sobre o que é um “festival”. Será que o festival seria igual ao primeiro Rock in Rio, em 1985, onde não tinha infraestrura alguma? Para exemplificar, no dia 16 de janeiro de 1985, nas apresentações do AC/DC e Scorpions, os lanches haviam se acabado, bebidas tinham sido esgotadas e a multidão se aglomeravam nas filas dos banheiros químicos. Faziam as necessidades na lama daquela noite chuvosa, sem telão e com um som de qualidade duvidável, a não ser pela ótima apresentação dos músicos, mas aí é uma outra questão.
Hoje, há atrações, há bares, stands, realmente é um “shopping” não no sentido pejorativo, mas da adequação. É tudo pop, é tudo consumo. Esta é a nova tendência dos festivais, muito diferente do mais famoso, o Woodstock de 1968, que aconteceu com objetivo de festejar a Paz, pois os Estados Unidos estavam em guerra. Outro festival famoso foi o Live Aid, que aconteceu em 1985, para arrecadar fundos contra a fome nos países africanos, especificamente a Etiópia; houve ainda o festival “feminista” Lilith Fair, nos Estados Unidos, que foi realizado entre os anos de 1996 e 1997, levantando a causa das mulheres, e tem ainda vários festivais famosos, como: Glastonbury Festival (Reino Unido), Lollapalooza, Coachella Fest, entre tantos outros, mas estes são puramente fomentadores de cultura.
Um chafariz era um outro ponto de fotos do evento
É irreversível. Nos Estados Unidos, na Inglaterra, entre outros países, a cultura dos festivais já acontecem há décadas. Os mais velhos sempre vão reclamar com saudosismo e sempre farão comparações com o passado e costumam a dizer ainda que o rock morreu. Desde os anos 70 os roqueiros-murmuradores falam isto, e sempre continuarão a falar. Mas, desde os anos 50 até agora, o rock e a música pop, se reinventaram várias vezes, gerações e gerações vestiram roupas diferentes, ouviram riffs diferentes, assim como as batidas completamente diferentes a cada ano. Mas é daí?
Criticar um festival porque lá tem a Katy Perry, ou porque tem Roda Gigante e Montanha Rurra? O grupo The Jam, dos anos 70, já afirmava “That’s Entertaiment”, e como o Camisa de Vênus a traduziu: “É só pra passar tempo”, enfim, é puro entretenimento. Pela critica do jornalista, é porque lá tinha muitas lojas, banheiros e bares o bastante para se entreter? Bom, o importante disto tudo é que tinha música, então aumenta que isto daí é rock and roll, e viva os festivais!