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Álbum de fotografias, memórias, facebook e a felicidade falsa

Lembro de uma aula do professor de história Ivanir, na antiga 6ª série, pois ele nos mostrou uma foto em nosso livro, que se tratava de uma imagem pré-histórica desenhada pelos homens de cro magnon há milhares de anos. A imagem era de vários homens caçando e no centro do desenho tinha um animal que seria a caça, e o professor nos explicou que aquele registro era importante para a nossa história pois retratava um modo de vida daquele povo, pois a caça, era um evento social importantíssimo para a cultura e também para a sobrevivência do grupo, pois a identidade não era individual, mas sim coletiva, por isto as imagens geralmente eram de pessoas em grupo.

Aquela aula ficou marcada até hoje, pois a nossa identidade é o que nos move dentro desta sociedade em que vivemos, e nos tempos atuais ela é múltipla, como explica Stuart Hall, em seu livro “A identidade cultural na pós modernidade”. Diante desta multiplicidade de identidades que possuímos, algo me incomodou muito nos últimos tempos com a declaração do renomado filósofo Leandro Karnal. Ele afirmou em uma palestra, aliás, orientou a todos “a pararem de postar felicidade falsa no facebook”, e isto foi compartilhado por milhares de pessoas, do próprio facebook, como uma afirmação “feliz”, basta saber, se era do filósofo, ou da “felicidade falsa” de quem compartilhava deste pensamento.

Quem sou eu para entrar em um debate com Leandro Karnal, assistir ao seu vídeo no youtube que alguém intitulou: “Para de postar felicidade falsa no facebook”, me incomodou muito. Isto porque, ele fala de vários assuntos, citando Hamlet, O príncipe, entre outros escritores, e no final solta esta frase polêmica, que eu ouso a discordar do filósofo, pois o papel das redes sociais é exatamente este: postar a felicidade, mesmo que seja uma felicidade idealizada, pois ela é a possibilidade da construção de uma felicidade real, como a imagem dos desenhos do homem das cavernas, afinal, nem todas as caçadas tinham sucesso, mas eram idealizadas.

No passado, os álbuns de fotografias, das nossas mães e avós, eram compartilhados apenas por parentes, e entes mais íntimos da família, pois as pessoas sentavam na sala, em um café ou lanche da tarde e ficavam ali, folheando as memórias “felizes” do passado. Hoje, a felicidade é no presente, e constitui um novo conceito do homem moderno com as tecnologias em tempo real.

Vários pensadores, filósofos, escritores afirmam que, quanto mais nos conhecemos, mais devemos nos entristecer, como Fernando Pessoa em seu Livro do Desassossego, ele faz as seguintes afirmações: “...Fugir ao que conheço, fugir ao que é meu, fugir ao que amo...” “... Parece-me que sonho cada vez mais longe, que cada vez mais sonho o vago, o impreciso, o invisionável. ” “...Quanto mais me vejo rodeado, mais me isolo e entristeço...”

Temos então que concordar com tais pensamentos? Eu não posso me conhecer profundamente e me sentir feliz com possíveis mudanças? Pelo filósofo e alguns pensadores não. Podemos citar também Aristóteles, que ao passar por uma feira em Atenas e ao ver tantas coisas desnecessárias sendo vendidas, falou que o homem não precisaria de nada daquilo para viver, em outras palavras, não precisava de “coisas” materiais para serem felizes.

É claro que sabemos disto. Temos plena consciência, ou deveríamos ter, que a felicidade real é a que nasce dentro de cada indivíduo, dentro de um ambiente social adequado. O antropólogo Roberto da Matta em sua obra “A casa, a rua e o trabalho”, é um retrato desta múltipla identidade, pois o bem-estar social deve estar em harmonia nestes ambientes, assim como o seu bem-estar pessoal-sentimental. Hoje as redes sociais é um novo ambiente a ser estudado e analisado profundamente, e enquanto isto não acontece, ignoremos o conselho de Leandro Karnal, pois continuaremos a postar a nossa felicidade no facebook, mesmo que idealizada, afinal, há um verbo que não foi analisado pelo filósofo: compartilhar, pois esta palavra tem um novo contexto, em um novo tempo, mas Karnal não tem redes sociais, seria ele então feliz, ou triste porque conhece a si mesmo.

A catarse do vazio: o caso Uniban ou caso Geisy?

Por Sérgio Pires
A estudante Geisy Arruda ao ser expulsa da Uniban coloca a faculdade no mesmo balaio dos alunos que a insultaram, como uma catarse coletiva, passando a garota de vítima como a culpada dos fatos que aconteceram no último dia 22 de outubro. Parte da mídia ou da opinião pública pode até dizer que a aluna tem parcela de culpa, quando de fato não tem. O caso da garota pode ser avaliado por uma questão simples: identidade.

Ciampa (1984) afirma que “no seu conjunto, as identidades constituem a sociedade, ao mesmo tempo em que são constituídas, cada um por ela”. Cada indivíduo, dentro da sociedade na qual faz parte se constitui através das relações sociais, assume identidade pessoal em sua história de vida. Tanto os indivíduos quanto a sociedade estão sempre interligados.

Dessa forma, o vestuário é fundamental para a constituição desta identidade, pois é um canal de comunicação aceito por todos. A forma de se vestir pode ser uma representação da identidade, pois de acordo com Hall (2005) de um lado nos diferencia, marca a individualidade e, por outro, nos iguala e também nos confunde dentro de um grupo.

Hall afirma que a identidade ao mesmo tempo muda de acordo com a forma como o sujeito é interpretado ou representado. Dessa forma, Geisy nada mais fez do que se expressar através da roupa, pois sua indumentária é uma forma de comunicar, faz parte de sua identidade. Hall relata que esse processo é às vezes descrito como constituindo uma mudança de uma política de identidade de classe para uma política de diferença.

De acordo com Hall, esta identidade pode ser positiva ou negativa, ganhada ou perdida. Porém, quando compararmos aos fatos que aconteceram com a estudante, ela não só perdeu a identidade, mas sim, a tiraram, ou seja, ao ser expulda, sua identidade foi roubada.

A nota divulgada pela Uniban no último domingo (08) nos grandes jornais de São Paulo, relata que a estudante “tem freqüentado as dependências da unidade em trajes inadequados, indicando uma postura incompatível com o ambiente da universidade...” Se, ao partir da lógica de Hall sobre identidade e sobre a afirmação do posicionamento da Uniban, a aluna não tem uma identidade de acordo com seus padrões. Ou seja, revelou aí uma INTOLERÂNCIA grave.

Todos têm o direito de se expressar, seja através das artes, da música ou da moda. Mesmo que ela choque, é preciso ter tolerância e respeitar as diferenças. Nos anos 60 a estilista inglesa Mary Quant inventou a mini-saia ao cortar o vestido de uma manequim e, o impacto surtiu um efeito que foi além da moral, mas sim político e influenciaria toda a juventude dos anos 60 por chocar os padrões de conduta. A mini-saia subverteu o moralismo tradicionalista imposto às mulheres. Antes o modelo da mulher era doméstica, dona de casa e submetida ao marido.

Nessa mesma época, a geração bay-boom do pós-guerra atinge a adolescência e rompe os arquétipos morais e ideológicos que moldaram as mentalidades e os costumes das épocas passadas. A música, o corpo e o vestuário, serviam para compor a identidade e para alcançar objetivo de “protestar”. O rock então surge com seu ritmo considerado do diabo com uma dança lasciva e proibida de Elvis com suas roupas justas e contra os “bons costumes”, porém isso serviu de armas emancipadoras pela liberdade de costumes e idéias que se prolongaram pelos anos seguintes.

Se as pessoas não puderem se expressar através da roupa, em um ambiente universitário, por ser subversiva. Logo serão proibidas as idéias ou qualquer outro tipo de manifestação que fere os padrões impostos. Porém, o exemplo mal dado pelos alunos da Uniban, assim como da diretoria de expulsar a estudante coloca em cheque o papel universitário e faz questionar sobre o pensamento da atual juventude e sobre a identidade do jovem contemporâneo. Afinal, é na universidade o local onde as idéias acontecem através das artes, da literatura, da sociologia, entre outras áreas e, até mesmo da moda através da forma de se vestir.




Bibliografia

CIAMPA, A. Costa. “ Identidade ”. In: Psicologia Social. O homem em movimento. Organizado por Silvia Lane e Wanderley Codo. São Paulo, Brasiliense, 1984.

Hall, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-modernidade / DP&A, 11ª Edição 2006

Fashion Bubbles> A invenção da mini-saia>. Disponível em < http://www.fashionbubbles.com/2006/a-invencao-da-mini-saia/> Acesso em: 9 novembro de 2009.